Pergaminho de Westeros - Relato da Segunda Aventura

Na quinta-feira, dia 26 de janeiro de 2012, tivemos nossa segunda mesa da campanha online de GURPS 4ª Edição ambientada no cenário de Game of Thrones, mais precisamente nos eventos que desencadearão a Rebelião Blackfire, a aproximadamente 100 anos antes do atual período em que é contado as Crônicas de Gelo e Fogo.

Como disse anteriormente, utilizamos um combo de programas: Fantasy Grounds II (como virtual table) e oTeam Speak 3 (para narração e interação dos jogadores), tornando a mesa bastante dinâmica.

Nossa mesa é composta por André "Mith" (Grimm Hightower), André Morelo (Percival Ruh), Darwin (Meistre Aethan Baratheon), Rafael Hrasko (Markk Stark - que se ausentou logo no começo da mesa), Ronaldo (Aldos Karstark) e Vicente (Bowen Smellyton).

Nesta segunda narrativa buscamos uma forma diferenciada da primeira, tentando seguir o padrão de George R. R. Martin e contando a história através do ponto de vista das personagens dos jogadores. Espero que se divirtam: 



                                                                          Aethan


As pernas de Aethan já estavam dormentes de tanto cavalgar e as muralhas vermelhas de Porto Real estavam longe de serem vistas. Ajeitando o peso do colar de Meistre em seu pescoço, de forma a minimizar a dor na região, ele suspirava enquanto pensava nas módicas mas confortáveis instalações dos meistres localizada na Fortaleza Vermelha, próxima a grande biblioteca. Módicas e espartanas, mas tudo aquilo desejado após os longos dias de cavalgada.

– Um banho, um prato de comida e roupas limpas – suspirava e repetia o combalido meistre como se fosse um mantra, esperando pelo conforto tão esperado.

Nem mesmo o tão falante Percival Ruh, uma boa companhia durante toda a viagem, dedilhava sua viola como fizera de forma incansável. Após o confronto com os saltimbancos, o bardo ensaiou algumas estrofes de uma canção que ele dizia que se intitularia "Os Bobos da Torre Quebrada", mas logo o cansaço voltou a se abater sobre ele. O único que parecia estar tal qual quando partiram de Vilavelha era o gigantesco Grimm, portando o estandarte da torre branca sobre fundo preto de sua casa de forma altiva e senhorial. Um bom homem, mesmo sendo tão sério.

O caminho que outrora se revelava livre a frente deles agora se tornava deveras difícil de ser vencido, visto as centenas de pessoas, cavalos e carroças que seguiam pela mesma estrada que eles, pessoas atraídas de todas as partes de Westeros para o evento que elevaria o príncipe Baelor "Lança Partida" Targaryen a posição de Mão do Rei. Nortenhos, povos da terra dos rios, das terras altas, carruagens riquíssimas de Lannisporto, carroças e mais carroças de comidas e bebidas de todo tipo, bem como as coisas mais diversas eram vistas naquele mar de gente.

A estrada calçada pouco ajudava, com buracos e lama e fezes de animais por toda parte. Aqui e acolá podiam ser encontrados alguns mercadores que aproveitavam o trânsito intenso de pessoas para vender bebidas e comidas das mais diversas, transformando a estrada em uma grande feira. Os soldados de manto dourado da cidade já podiam ser vistos, mas pouco faziam visto a tamanha confusão propiciada por tão grande turba.

Aethan orientara o grupo armado para que se dispusessem em torno da caravana, buscando proteger seus pertences dos gatunos que aproveitariam daquela confusão para executar seu ofício. Com tantas pessoas andando juntas e se esbarrando, um ladrão habilidoso poderia retirar até as roupas de sua presa antes de ser percebido.

Após longos minutos, a comitiva contornou uma pequena colina encabeçada por ciprestes, chegando a parte final da estrada e enfim avistando às poderosas muralhas de Porto Real. Ao longe Aethan identificou com facilidade as maiores construções que se destacavam na paisagem: sobre a Colina de Visenya se destacava o Grande Septo de Baelor, maior templo dedicado ao culto dos Sete, cercado por sete gigantescos pináculos que representavam o pai, a mãe, o guerreiro, a donzela, o ferreiro, a anciã e o estranho, facetas  cultuadas por grande parte do povo de Westeros. Sobre a Colina de Rhaenys repousa o outrora grandioso , agora em ruínas, Poço dos Dragões, local que abrigava os grandiosos e poderosos dragões cavalgados pelos Targaryen, trunfo responsável pela conquista de todas as terras no passado. Por fim a maior das construções da cidade repousava sobre a Colina de Aegon: a Fortaleza Vermelha, lar do Rei Daeron II e de vários outros reis Targaryen antes dele. Aethan se lembra bem da Fortaleza Vermelha de seus tempos como noviço, visto que passou alguns meses estudando nas bibliotecas de Porto Real, buscando aprender todo o conhecimento guardado por séculos pelos Grandes Meistres que habitaram aquele sítio.

A visão de tão conhecida paisagem alegrou o Meistre, fazendo com que ele esquecesse temporariamente todo o cansaço de seu corpo. Incitando sua montaria a avançar, logo avistou o gigantesco Portão dos Deuses, acesso para o interior das muralhas. Com alguma dificuldade, Aethan adiantou seu cavalo para emparelhar com Grimm, a fim de conversar com o nobre.

– Meu senhor, aquele é o Portão dos Deuses. Devemos seguir a estrada que parte de lá para sudoeste para chegar ao campo de torneios.

Com um leve acenar de cabeça concordando com a orientação do Meistre, Grimm Hightower se virou para sua comitiva e, com sua poderosa voz, bradou:

– Sigam-me pela estrada que parte do portão à frente e se adiantem! As barracas deverão estar prontas antes do fim da tarde!

Cavalgando a frente e abrindo caminho para seu grupo utilizando seu cajado de madeira negra para afastar sem ferir os viajantes, Aethan e Grimm logo alcançaram o portão. De lá, um grupo de guardas de capas douradas se juntou a eles, após identificar o grupo. Acessando a estrada secundária e de passagem mais tranqüila, o grupo logo atingiu o grande campo de torneios.

Aethan reparou que a alegria voltou a face do menestrel Percival ao ver que sua longa jornada chegou ao fim. O homem não perdeu tempo e logo começou a usar sua poderosa voz para cantar a chegada da comitiva, bem como sua nova obra que falava sobre o combate contra os bandidos.

Em um galope rápido, a comitiva logo se aproximou da colina onde estavam sendo montadas as barracas da nobreza de Westeros. Ao centro podia ser vista a maior delas, dedicada aos Targaryen. Todas as outras barracas chamavam pouca atenção ante a grandiosidade e suntuosidade do barracão real, com exceção de uma única. Aethan reconheceu com facilidade a bandeira do leão dourado sobre fundo vermelho carmesim que se desfraldava sobre a barraca como sendo da poderosa Casa Lannister. Chamando a atenção de Grimm para o fato, ele apenas ouviu do seu senhor:

– Os Lannisters são abusados na mesma proporção que ricos, companheiro – respondeu o grandalhão.

O meistre se adiantou a galope e logo identificou a bandeira que marcava o sítio onde deveriam armar a barraca. Orientando o grupo para que começasse a montar o acampamento, ele viu que seus serviços ali tinham acabado por enquanto, mas muitos outros o esperavam na cidade.

– Mestre Grimm – chamou Aethan enquanto o nobre começava a orientar a montagem da barraca e os demais preparativos – Preciso seguir até a biblioteca da Fortaleza Real. Tenho que repassar algumas anotações para os noviços e me apresentar a meu superior na ordem.

– Que assim seja, Aethan. Leve dois homens contigo e nos encontre ao fim de seus afazeres na festa – disse Grimm, voltando então a seus afazeres.

Escolhendo dois homens conhecidos, Aethan voltou a montar e cavalgou o mais rápido possível para a Fortaleza Vermelha, a fim de terminar logo seus afazeres e descansar um pouco antes da grande festa da noite.

Aldos

As barracas já estavam montadas a espera da caravana vinda do norte. Aldos já tinha conferido tudo pela terceira vez, certificando-se de que estava tudo perfeito. Era de sua natureza perspicaz e meticulosa ter o controle de tudo que acontecia a seu redor, evitando ser surpreendido por adventos inesperados.

O vinho batizado com leite de papoula tinha diminuído bastante a dor de suas costas, fazendo-o andar da forma mais perfeita que sua deficiência permitia. Vestira uma belíssima túnica cinza, com calças e colete de cor preta impecável. Seu cabelo e barba estavam perfeitamente aparados e mesmo a bengala que o auxiliava em seu andar era belíssima, feita com madeira negra de freixo encimada por uma belíssima pérola negra.

Aguardando de forma paciente na frente da barraca, ele foi o primeiro a avistar de longe a comitiva vinda de Winterfell. A frente identificou seu primo, Markk Stark, por quem nutria uma amizade antiga. Markk era um guerreiro, mas também uma boa companhia em eventos e festas, visto sua predileção por qualidade, principalmente em sua escolha de vinhos, algo que agradava em muito a Aldos. Ao lado do primo cavalgava um rapazola de não mais que doze anos, mal-vestido e com porte nem um pouco altivo. Os dois cavalgaram lado-a-lado até perto da colina onde estava montado o acampamento, quando pararam, conversaram por um breve instante e, após Markk entregar algo ao rapaz, este se pôs em rápida corrida na direção de Porto Real.

– Boas vindas a Porto Real, Markk! – disse de forma altiva Aldos, com seu melhor sorriso marcando a face.

– É bom vê-lo por aqui, primo! Assim tenho certeza de que apenas o melhor me espera! – respondeu Markk, descendo do garranho em que montava e abraçando o primo.

Aldos conduziu seu primo e todos os outros nobres vindos do norte para suas acomodações dentro da barraca, bem como orientou aos serviçais onde dispor da bagagem que traziam. Banhos e uma refeição frugal já esperavam pelos senhores, que dali seguiriam para a Fortaleza Vermelha para acompanhar o jantar de abertura da semana de festividades que durariam uma semana.

Tudo estava perfeitamente organizado e Aldos foi elogiado por sua presteza. Logo ficou sabendo do que ocorrera a todos durante o caminho, principalmente sobre o encontro com os bandoleiros nas proximidades de Porto real. Quando todos estavam prontos, Markk procurou por Aldos. Aparentava estar muito cansado graças à viagem.

– Aldos, preciso lhe falar. Estou muito cansado da viagem e do confronto com os bandidos. Gostaria de saber se você poderia acompanhar meu jovem irmão ao evento, enquanto descanso e reponho minhas forças. Assim que eu estiver descansado, seguirei até o castelo.

– Não tem problema, Markk. Cuidarei do jovem Bram. Descanse não se preocupe que trarei uma boa garrafa de vinho da Árvore para você!

Após am conversa com o primo, Aldos seguiu com Bram e os outros nobres em seus cavalos na direção de Porto Real e da Fortaleza Vermelha. No caminho viu vários agrupamentos de outras casas maiores e menores e constatou que quase toda a nobreza de Westeros estava ali para presenciar a nomeação. Pensou novamente nas informações que tinha obtido desde que chegara a Porto Real e viu que tudo fazia cada vez mais sentido.

– Ele não poderia ter escolhido momento melhor para agir – pensou Aldos, enquanto conduzia seu palafrém pelas ruas da cidade, na direção do local onde ocorreria mais um importante movimento naquele grande jogo de poder.

Grimm

Grimm Hightower observava a cidade de Porto Real de forma atenciosa. Dizer que um lugar como aquele era superior a Vilavelha era um absurdo, visto a quantidade de mazelas aparentes por todo lado. Seus companheiros de cavalgada pareciam pouco se importar com tudo aquilo, visto que uma grandiosa festa os esperava na Fortaleza Vermelha.

– Por que está tão quieto, Grimm? Chateado com alguma coisa? – perguntou seu irmão Gunthor, enquanto aproximava seu cavalo.

– Não, meu irmão. Só observava esta cidade e seu povo. Tudo aqui é tão sujo é tão sujo e desorganizado. Não entendo como um regente pode deixar as coisas chegarem a este ponto.

– Os nobres pouco se importam com o que acontece a plebe, Grimm. Deixe de ser inocente – respondeu Gunthor com um sorriso de escárnio, enquanto esporeava seu cavalo e se aproximava de seu pai, que seguia na cabeça da fileira.

Passaram-se mais alguns minutos até chegarem a Colina de Aegon. Subindo a ladeira calçada em meio a vários outros grupos de nobres, logo chegaram aos imensos portões da Fortaleza Vermelha. Estátuas de dragões podiam ser vistas por toda parte, bem como um grande contingente de soldados de capas douradas, rondando por toda à parte em atenção constante. Uma aglomeração tão grande de pessoas importantes demandava de tal vigília, principalmente pelos ânimos dos próprios senhores, muitos deles inimigos mortais de seus pares. Seria difícil manter as estribeiras e respeitar o poder Targaryen caso um nobre com pouco autocontrole bebesse um pouco mais. Mas os soldados fortemente armados poderiam faze-los mudar de idéia.

Um jovem cavalariço se aproximou e pegou o cavalo de Grimm, com uma reverencia deveras respeitosa. Olhando para a fachada do salão principal, onde aconteceria a festa, o grande guerreiro seguiu seus irmãos e parentes para dentro do grande salão. Logo o forte cheiro de lenha queimando e comidas de todo tipo pode ser sentida, fazendo a barriga de Grimm roncar levemente.

O grupo se dirigiu para uma grande mesa que mantinha uma bandeira de sua casa, disposta próxima a grande mesa reservada a Casa Tyrell, da qual a Casa Hightower era vassala. Os nobres Tyrell já tinham tomado seus lugares na mesa e se serviam de um grande javali assado, regado a um bom vinho. O pai de Grimm se aproximou do Lorde Garlan Tyrell e fez uma longa e respeitosa reverência. Atrás dele, Grimm e todos os seus irmãos acompanharam na reverência, em sinal claro de respeito a casa Tyrell. Lorde Garlan devolveu o cumprimento e dispensou os Hightower para que eles tomassem seus lugares.

Logo ocuparam seus lugares e foram muito bem servidos. Comida e bebida do melhor, os Hightower afogavam o cansaço da viagem em vinho, acompanhado de pernis, codornas, pombos, caranguejos e muitos outros pratos. Grimm comeu e bebeu, observando a tudo que acontecia perto deles. Logo Meistre Aethan se juntava a eles, contando sobre seu encontro com o Grande Meistre Riothin na biblioteca do castelo, bem como a transcrição do conhecimento arregimentado na viagem em papiros e livros, guardando para sempre aquelas informações sobre plantas, animais e outros assuntos dos quais os meistres tanto se importavam.

Momentos depois, trombetas chamaram a atenção de todos para a chegada da família real. Seguindo a frente vinham o rei Daeron II Targaryen e sua senhora, a princesa dornesa Miriah Martell. Logo atrás deles vinha o príncipe Baelor “Lança Partida” Targaryen, com seu reluzente colar de ouro, cujos elos tinham a forma de pequenas mãos, símbolo de todos aqueles festejos, e marca da sua nomeação como Mão do Rei. Os outros nobres e vassalos seguiam atrás, em cortejo solene. Logo todos ocuparam seus lugares na mesa principal, com exceção do rei que iria abrir oficialmente a semana de festas.

– Bem vindos, senhores de terras por toda Westeros. Fico feliz com a presença de todos nesta ocasião tão especial. Eu, minha senhora Miriah e meu filho e Mão do Rei, Baelor, estamos muito contentes com tamanha demonstração de vassalagem e préstimos. Peço que todos...

Uma pancada abriu a porta de entrada para o salão, interrompendo o discurso real e atraindo os olhares furiosos do rei, da rainha e do príncipe para o portão. Lá, entrando com toda pompa, vinha a frente o primeiro dos bastardos reais, Daemon Blackfyre, ladeado pelo meio-irmão Aegor “Aço Amargo” Rivers, um guerreiro e comandante de tropas ímpar. Alguns soldados de maior patente entre os que serviam os bastardos seguiam atrás, com caras intimidadoras.

Com cara de espanto, Daemon Blackfyre interrompeu sua entrada triunfante e, olhando para o rei em uma tentativa falha de parecer inocente.

– Mil perdões se interrompi algo, meu irmão. Espero que possa perdoar este vosso vassalo servil por tamanho incômodo – disse com sua voz sonora e melodiosa, enquanto fitava com seus belos olhos púrpuras o irmão que não conseguia esconder a raiva.

O príncipe Baelor buscou se levantar, já com a mão sobre o cabo da espada, mas foi interrompido pelo pai que, com sua segurança e frieza típica, respondeu ao meio-irmão:

– Sua chegada inoportuna será perdoada, irmão. Agora, se ponha em silêncio junto aos outros e ouça em silêncio o que tenho a dizer como o vassalo que és.

Daemon pouco pareceu se importar com a rudeza do irmão. Se prostrando em uma vênia, seguiu na direção de uma mesa que fora reservada para ele e para Aegor. Após a comitiva do bastardo ter se sentado, Daeron II deu prosseguimento a seu discurso.

– Amanhã começaremos os eventos com uma maravilhosa caçada na Mata do Rei. O mais exímio caçador do dia receberá como prêmio uma belíssima trompa de caça, item sem preço que pertence a Casa Targaryen a gerações. Todos aqui estão convidados para demonstrar suas habilidades. Ao fim da noite, durante o jantar, iremos premiar o vencedor ante a todos os presentes.

O rei foi ovacionado pelos súditos, que esqueceram por alguns instantes do ocorrido anteriormente. Assim que o aclame se silenciou, Daeron se preparou para finalizar seu discurso.

– Desejo uma ótima e festiva noite a todos! Apreciem o que temos de melhor em toda Westeros!

Os festejos se reiniciaram e todos buscaram aproveitar ao máximo toda aquela opulência. Grimm ficou pensativo por alguns instantes, observando os olhares nervosos que eram trocados entre a mesa real e a mesa dos bastardos. Só então reparou a sombra de um dos arcos da lateral uma dupla que observava a tudo em silêncio. Difícil não ter reparado antes, visto que os dois chamavam bastante atenção, cada um a sua forma. Uma belíssima mulher, a mais bela já vista por Grimm, estava de braços dados com um homem claramente Targaryen, visto sua aparência: cabelos prateados, pele alva e olhos púrpuras. Uma marca vermelho-sangue podia ser vista em sua bochecha direita.

Grimm chamou a atenção de Meistre Aethan para a dupla. Após uma olhadela, Aethan os identificou como sendo os bastardos Shiera Seastar e Brynden “Corvo Sangrento” Rivers, meio-irmãos do rei.

Aquela informação atiçou ainda mais a curiosidade de Grimm. Pedindo licença a seus pares, se pôs de pé e começou a rondar pelo salão, buscando descobrir o máximo possível com os ali presentes.

O nobre se juntou a grupos em conversa, dançou com uma ou outra dama, cochichou ao pé do ouvido de uma aia e passou uma moeda de prata a um garçom. Ao fim da procura, descobriu o que se passava entre os grupos: os bastardos Daemon e Aegor eram ferrenhos opositores do rei, visto que estavam na linha de sucessão e buscavam o poder. Tinham acabado de chegar de uma longa viagem para o sul de Westeros, viagem esta que durou pouco mais de um ano e andavam sempre ladeados de muitos soldados e nobres de casas menores. Já os outros bastardos, Shiera e Brynden, pareciam se afeiçoar ao irmão coroado, tendo os dois inclusive um aposento na Fortaleza Vermelha. Dizia-se até que os dois eram amantes!

Grimm matutou aquela informação por um bom tempo e logo compartilhou o sabido com Aethan. O meistre disse então ao nobre que sabia da relação entre Daemon e vários nobres de casas menores, bem como informou que o bastardo Blackfyre era querido por grande parte da população de Porto Real.

A festa se prolongou por mais algum tempo até chegar a hora em que o rei e sua corte se levantaram e saíram do salão, sem muito alarde. Instantes depois, após algumas conversas baixas entre eles, Daemon e Aegor se dispuseram a fazer o mesmo, abandonando o salão e se juntando a um grupo que os esperava do lado de fora. Aethan identificou dois deles como sendo Carls Banefort e Amory Lorch, dois influentes nobres. Junto a eles estavam três outros homens que nem o meistre nem Grimm conseguiram identificar.

Muitos já tinham saído da festa, buscando se recolher a suas barracas para poder descansar e estarem preparados para a grande caçada do outro dia. Os integrantes da Casa Hightower tiveram a mesma idéia. Após algumas despedidas rápidas, todos seguiram na direção do grande portão. Grimm, seguindo logo atrás, passou mais uma vez os olhos no grande salão, lembrando de lampejo dos acontecimentos da noite. Seus olhos seguiram por todos os que ali ainda estavam, até se deparar com um velho conhecido que o fitava com olhos mordazes.

– Lothar Florent – sussurrou Grimm, ao mesmo tempo em que seu irmão chamava sua atenção para adiantar o passo.

O guerreiro fitou por um breve instante seu inimigo declarado, mostrando não ter medo daquele homem. Isto posto, marchou determinado e resoluto atrás de seus parentes.

Bowen

Volta aqui, seu bastardo filho de uma rameira!

O jovem Bowen tentava fugir e se vestir ao mesmo tempo, enquanto a prostituta gritava impropérios da janela do bordel. O rapaz fugira sem pagar os préstimos da gorda rameira, que o servira em uma tarde inteira de prazer. Após se afogar em meio aos seios fartos da mulher, o rapaz se lembrou do compromisso na Fortaleza Vermelha, compromisso este no qual já estava atrasado. Aproveitando que a mulher roncava debaixo dos sujos lençóis, o rapaz se pôs pé-antepé buscando sair silencioso do quarto, mas fora frustrado e agora se punha a correr em fuga.

As vielas da cidade eram conhecidas para ele, mesmo após longos meses longe. Após alguns instantes, estava em segurança longe do bordel, aproveitando a paz para se arrumar o mais decente que conseguia. Um forte cheiro de sexo e bebida barata permeava todo seu corpo e suas vestes, bem como o suor da corrida de fuga, mas Bowen pouco parecia se importar com aquilo.

Hoje eu descubro o que aconteceu com meu pai murmurava ele enquanto andava na direção da festa.

Não muito tempo depois, o rapaz já adentrava os grandes portões da fortaleza. Após ser barrado por dois guardas de mantos dourados, que questionaram sua presença ali, ele mostrou o lobo branco cozido na sua túnica, dizendo que ele era um escudeiro da Casa Stark. Após alguns resmungos, os dois guardas deixaram o rapaz entrar.

Assim que chegou ao grande salão, o rapaz chegou a tempo de ver um pequeno rebuliço se formar. Em uma mesa afastada, um homem que ele reconheceu como sendo o bastardo Blackfyre estava afrontando claramente o rei e seu filho. A confusão fez com que a chegada dele não fosse percebida por ninguém, facilitando sua chegada de forma furtiva até a mesa da Casa Stark, onde se sentou e logo levou as mãos para um belo pernil que estava a sua frente. Após cravar os dentes na suculenta carne, levantou os olhos e se deparou com um velho desconhecido o encarando com cara de poucos amigos.

Quem é você, rapaz? Perguntou o homem de forma inquisitiva.

Sou Bowen, amigo de Markk. Porque quer saber?  respondeu de forma petulante o rapaz, olhando atravessado para o almofadinha.

Não reconhece um nobre quando vê, moleque? Sou Aldos Karstark e falarei com Markk sobre sua postura aqui neste jantar disse por fim o homem, passando a ignorar a presença de Bowen e se ater a observar e falar com aqueles que julgava serem merecedores de sua atenção.

O rapaz não se preocupou com a ameaça do nobre e continuou a comer como um faminto. Após algum tempo, já satisfeito, agarrou uma grande taça de cerveja e começou a rondar pelos cantos do salão, observando a tudo e a todos. Seus olhos perambularam por rostos, vestes e principalmente jóias, mas aquela noite ele não tinha tempo para aquilo. Parou um pouco a observar a mesa da Casa Baratheon, casa esta da qual vinha seu pai e ele mesmo. Mas isto foi antes de se tornar um bandido, um vagabundo, um "Smellington". Seus parentes não pareciam muito felizes por estar ali, também pudera: aquele mesmo tinha acusado um grande Baratheon de traição, lançando ele e sua família em desgraça. Aquilo era muito para a honra da Casa, mas eles não podiam se rebelar e virar as costas contra os Targaryen. Outros já o tinham feito e não viveram muito após o afrontamento.

Bowen circulou entre o povo do salão mais algumas vezes, buscando chamar o mínimo possível de atenção, buscando chegar o mais próximo possível da mesa dos bastardos. Algo dizia ao rapaz que boa coisa não acontecia por ali e, se estivesse próximo, poderia captar algo. Foi então que viu sob um dos arcos laterais os dois outros bastardos Blackfyre: Shiera e Brynden. Bowen os reconheceu prontamente dos tempos em que andou por Porto Real. Sabia que Shiera, a mais bela mulher de todo o reino, como diziam alguns, sempre fora misteriosa. Muitos até diziam que ela era uma Maegi e pactuava com demônios para manter sua beleza. Sabia também que Brynden era considerado um dos maiores caçadores de toda Westeros, bem como um homem influente entre os informantes da cidade.

Dizia-se que Brynden também gostava de pactuar com coisas obscuras e a mancha de seu rosto foi resultado de uma destas magias negras. Os caçadores de cervos diziam que o arco de Brynden era mágico e uma flecha disparada por ele atingia duas vezes a distância de um arco normal. O motivo era a madeira do qual o arco fora feito: o coração de um represeiro, a árvore símbolo do culto aos velhos deuses dos homens do norte. Segundo contam, Brynden matou uma destas árvores, arrancando de seu interior a madeira sagrada para fazer seu arco.

Bowen se recostou em um pilar e observou longamente os dois. Assim ficou até a hora em que eles se levantaram em silêncio e  seguiram por um corredor lateral. O rapaz seguiu os dois o mais silencioso que pode, buscando parecer um ébrio que rondava a esmo. Brynden virou para encará-lo uma vez, ignorando-o logo depois. Seguindo na direção de uma escada em caracol que levava para os andares superiores, a dupla parou por alguns instantes, cochicharam algo um com outro e, enquanto Shiera subia as escadas, Brynden ficou para confrontar o rapaz.

Bowen olhou para o homem e se demorou na mancha em seu rosto. Buscando parecer incomodado com o olhar inquisitivo do bastardo, o rapaz o encarou de volta com cara de poucos amigos. Brynden por sua vez o encarou calmamente e disse com sua voz baixa:

Seu pai é um bom homem, rapaz. Não acredito que ele seja um traidor.

Bowen arregalou os olhos com aquela afirmação, sem entender como Brynden saberia que ele era filho de Sor Andrus Baratheon, acusado de alta traição pelo Rei Daeron II e aprisionado na Fortaleza Vermelha desde então. Para não se entregar, o rapaz retrucou de forma truculenta:

Não sei do que você está falando, sor!

Brynden encarou com seus olhos lilases o rapaz e sorriu. Acenando com a mão, chamou Bowen para segui-lo escada acima, coisa que ele o fez sem pestanejar.

Seguiram por uma longa escada em caracol até chegar ao seu fim. Passando por uma porta de madeira fortificada, Bowen se viu na seteira da mais alta torre da fortaleza, com uma vista privilegiada de toda a cidade. Empoleiradas sobre as ameias, dezenas de corvos observavam os dois atentamente, sem emitir nenhum crocitar. Bowen observou aquelas aves de forma suspeita, mas Brynden não pareceu se incomodar e se aproximou de uma seteira, se recostando contra a pedra vermelha.

Irei te ajudar a limpar o nome de seu pai, rapaz. Descanse que eu te procurarei disse de forma calma ao rapaz.

Bowen olhou demoradamente para Brynden, achando se tratar de uma brincadeira, mas os olhos do homem transmitiam uma segurança sem igual. Como se estivesse encantado, o rapaz saiu dali e seguiu até o acampamento na área de torneio e foi dormir pensando naquilo que o bastardo tinha lhe dito.

Percival

Percival encarava a muralha daquele misterioso fortim no Baixio das Pulgas, enquanto pensava nos acontecimentos que o levaram até ali.

Assim que deixou a comitiva de Grimm no acampamento, seguiu para a Fortaleza Vermelha buscando informações sobre os atacantes de sua família. Após o ataque,buscou informações sobre a identidade dos guerreiros e facilmente descobriu se tratar dos soldados de Daemon Blackfyre e de seu irmão, Aegor. Seguindo a trilha de mortos deixados pelos dois, soube que eles tinham retornado a Porto Real para aquele evento em específico, à frente de um pequeno mas poderoso exército formado por nobres de casas menores que ansiavam por poder.

Com poucas dificuldades, entrou nas dependências da Fortaleza Vermelha se fazendo de bardo errante, um daqueles que iria se apresentar na festa. Lá dentro, se esgueirou por corredores escuros e arcadas até chegar a um belo quarto ocupado por um nobre qualquer. Lá, Percival afanou em meio aos baús de ostentosas roupas um conjunto belíssimo de botas, calças, camisa e colete que lhe concederam a imagem ideal para andar pelos salões como um bem-nascido.

Aproveitando de toda pompa e circunstância que lhe era sabido, Percival andou, comeu, bebeu e principalmente falou com nobres de toda Westeros, para cada um falando um nome e uma localidade de nascimento diferente. Para os nortenhos, se identificou como um mercador de Vilavelha. Para os Lannister, se fez de mercador bravosiano. E assim buscou saber o máximo possível sobre os bastardos reais. Mas o ápice de sua noite foi à entrada de Daemon e de seu irmão.

Ao ver os dois, Percival logo procurou uma mesa próxima à deles e se esforçou ao máximo em ouvir o que falavam. Reparou na troca de olhares e ofensas veladas entre o rei e os dois e ficou atento a toda movimentação. Quando os dois se cansaram em afrontar o rei e se dispuseram para fora dali, Percival se fez de desentendido e os seguiu até o pátio do castelo. Lá se deparou com um grupo bem distinto aguardando pela saída dos bastardos: dois nobres que identificou como sendo Carls Banefort e Amory Lorch, fortemente armados. Além deles um homem de vestes e capa preta, um gordo vestido de sedas coloridas e um negro com uma exuberante capa feita com penas esperavam com seus cavalos já preparados para montar. Os sete montaram em seus cavalos e partiram em disparada. Percival prontamente correu até um cavalariço que trazia um belíssimo palafrém e, com um blefe rápido, recebeu de bom grado das mãos do rapaz o cavalo, partindo então em disparada atrás do grupo.

Após alguns minutos de cavalgada, o grupo seguido por Percival adentrou o Baixio das Pulgas, um antro dentro de Porto Real. As vielas eram bem conhecidas por Percival dos dias em que andou por aquela cidade, fazendo com que ele conseguisse seguir o grupo sem ser notado. Mesmo naquelas perigosas paragens, ninguém se atrevia a se interpor ante a eles, visto que o grupo andava muito bem armado.

Ao fim do percurso, Percival se deparou com um poderoso fortim incrustado na Colina de Rhaenys. Guardas faziam ronda nas ameias, todos armados com bestas pesadas e levando espadas longas na cintura. O grupo liderado por Daemon seguiu até o portão de madeira reforçado, que foi aberto para sua entrada. Lanternas estavam dispostas por quase todo canto, iluminando áreas e dificultando a entrada furtiva no local.

Percival observava cada um dos cantos e acreditava que conseguiria adentrar o fortim. A verdade sobre o que acontecera a sua família estava lá dentro e nada iria impedi-lo de consegui-la. 

1 comentários: (+add yours?)

MitH disse...

Agora sim! No final dessa mesa, George Martin vai comprar os direitos autorais pra lançar um livro paralelo!

Vamo que vamo, povo!

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